Total de visualizações de página

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Parei de Fumar


-Eu não te amo! Desculpe por tudo... Por ter tentado e não ter conseguido! Por ter vivido momentos intensos e perfeitos contigo! Tentei! Mas no fim só o que fiz foi me enganar... No fim, te enganar!

-Eu realmente queria te entender, - disse ele, com a voz trêmula - mas não consigo... Tu aprendeu a mentir pra mim! Você me trouxe até aqui pra isso? Então fala de uma vez, com todas as letras, que não quer mais nada!

-Eu gosto muito de ti... E - ela foi interrompida.

-Eu nunca pedi que me amasse!

-Eu tenho a necessidade de procurar alguém que eu consiga amar de todo meu íntimo... Sinto muito, mas pra mim já deu o que tinha que dar!

-E tu fala isso assim? Esse foi teu plano? Terminarmos no mesmo lugar onde começamos?

-Tu sabe que aqui é onde eu me sinto melhor! Eu quero continuar sua amiga. Não suportaria me afastar de repente de você.

Ele saiu, entrou no carro e foi embora. Ela ficou ali, sozinha, triste. Mexeu no celular, provavelmente contando pra alguma amiga tudo o que aconteceu. Algumas lágrimas molharam o celular. Passados uns 15 minutos, perguntei se poderia sentar ao seu lado. Com o nariz e olhos vermelhos, um tímido sorriso disse que sim. Tirei do maço um cigarro e ofereci um a ela.

-Não, não. Parei faz 3 semanas. Se bem que eu tava...

Antes que ela mudasse de ideia e aceitasse meu cigarro, falei:

-Tu tem razão!

Joguei o maço numa lixeira que estava a uns 10 metros do banco onde estávamos. Acertei. Restou-me o cigarro entre os dedos. Ela completando a frase que eu havia interrompido, disse:

-Bem que eu tava precisando de uma tragada agora...

-Você deu a última tragada da sua vida há 3 semanas. E eu, há 15 minutos.

Coloquei o cigarro no chão e pisei, amassando bem toda esperança dos viciados. Fiquei pensando se fui grosso com a garota. Ela ainda limpava o nariz com a ponta da manga da blusa. Não tenho idéia quanto tempo analisei em silêncio aquela mulher. Projetei várias frases, todas mudas. Até que ela quebrou o silêncio.

-Se te der vontade de fumar, liga pra esse número aqui.

Ela tirou do bolso um papel de propaganda de dentista. Atrás dele, escreveu um número com a caneta que estava no meu bolso. Idiotamente, não consegui falar nada para ela. Nem tempo ela me deu pra falar. Entrou num carro prata. No volante, uma loira de rosto bem desenhado me olhou fixamente. Foram embora.

Caminhei até minha casa, que era ali perto. Passei o resto do domingo jogando Super Mário.

Meu despertador me acorda num susto. Hora de trabalhar. Tomei um pretinho. Morri de vontade de acender um cigarro pra acompanhar. Não o fiz. Também, nem tinha cigarro em casa pra acender.

No fim do dia, eu já estava louco por um cigarro. Não tinha nada pra fazer. Resolvi ligar para o número dos "Fumantes Anônimos" que a garota chorona me deu no domingo.

-Alô.

-É dos Fumantes Anônimos? - Pergunto eu.

-Pode ser. Quem fala?

- Meu nome é Ivan Soares. Gostaria de fazer parte do grupo de vocês.

-Tudo bem, Ivan. Qual o horário se enquadra melhor na tua agenda?

-Após as 7 da noite, tem este horário? E onde é o encontro?

-Sim. Às 7 e meia, terças e quintas. Na Rua dos Marajós, 3443, 3º andar, ap 13. Ah! E se possível, não leve cigarros.

-Okay! Estarei lá. Com quem eu falei?

-Com Mariana.

-Obrigado, Mariana! Boa noite.

-Muito boa, senhor!

Eu achei a voz familiar e as respostas da atendente um pouco estranhas.

No outro dia, no horário marcado, estava eu na Rua dos Marajós. Rua bem residencial. Prédio bem residencial. Andar bem residencial. O apartamento 13 era o último do corredor. Toquei a campanhia.
Para minha surpresa, a moça chorona de domingo é quem abre a porta, porém, sua aparência não é mais de menina frágil. Ela me olha dentro dos olhos por alguns eternos segundos, como que rastreando minha alma. Ainda tentando me localizar, pergunto se ela lembra de mim. No que ela responde:
-Como esquecer de um cara que nega cigarro aos desesperados? Você tem cara de que me negaria um copo de água no deserto...
-Não! Longe de mim esta atitude. Mas esse nosso vício é suicida. Você não acha?
-Tens razão, querido Ivan! Siga-me.
- Como sabe meu nome?

Andando atrás dela, vou para a cozinha, onde tem uma espécie de barzinho.

O apartamento era grande e moderno. Cada cômodo tinha suas particularidades. A sala tinha uma estante em formato de árvore, que servia para guardar livros e cd's. A cozinha era toda decorada em branco, vermelho e preto.

Ela me oferece uma bebida. Eu aceitei um suco.  Começamos a conversar. Ela abre o jogo e fala que não existe "Fumantes Anônimos" algum. Que apenas deu o próprio telefone dela aquela vez e que eu que pensei que fosse um lugar de apoio para fumantes.

- Eu aqui sozinha nesta casa grande, achei interessante aceitar a sua ideia. Somos um grupo de 2. O que você acha?

Eu achei maravilhoso. Uma mulher linda, simpática, um pouco pirada. Foi tudo o que eu pedi a Deus!
Conversamos muito.

 Ela me contou que havia terminado com uma relação de 3 anos e meio, que já tinha se tornado insustentável pois mesmo ela se esforçando para amar o cara, ela não conseguia e do jeito que estava não valia mais a pena continuar. O ex dela foi viajar o mundo na segunda-feira, para supostamente esquecer o fim do namoro. Com tanto papo até esqueci que tinha vontade de fumar. Esqueci que o tempo corria. Esqueci do suco e fui pra algo mais forte. Quando dei por mim, calei ela com um beijo e disse que precisava ir.

Voltei no ap. 13 na quinta-feira, as 7 e meia da noite, como o combinado no primeiro telefonema. Só que dessa vez quem me atendeu foi uma outra Mariana. Não foi a chorona de domingo. Não foi a sedutora da terça. Foi a Mariana sem planos. A mais bela de todas as faces daquela mulher doida.

Mariana moleca. Meias cano curto, shorts, camisetão branco e cabelo bagunçado. Só o olhar continuava o mesmo. Me convidou pra entrar.

-Você não me ligou. Pensei que nunca mais o veria.
-Nunca é uma palavra muito forte! E no mais, assumi um compromisso com uma tal de Mariana, por tempo indeterminado, todas as terças e quintas as 7 e meia, na Rua dos Marajós, 3443, 3º andar, ap 13. Ah! Também, conforme o pedido da senhorita, não trarei cigarros. Porém, trouxe este vinho aqui. O que acha?
-Sabe de uma coisa? Você é mais louco que eu! E eu adoro vinho!

Bom, neste dia conheci outra parte da casa. O quarto. Mas este cômodo pouco reparei.

Algum tempo depois, meu vício tinha assumido o nome de Mariana. Eu respirava pensando nela. Vida de analista de sistemas não é a melhor coisa do mundo, mas ultimamente as coisas estavam fluindo muito bem. Meus pulmões se inflavam de vida ao lado da minha Mariana.

Estava eu indo para a casa da Mari, quando percebo uma movimentação estranha. Muita gente na rua. Tinham até policiais. Parecia que tinha acontecido algo no condomínio. Tentei passar, mas a multidão era tremenda. Repórteres estavam no local. Ninguém podia entrar ou sair do prédio. Para ajudar, não levei meu óculos e de longe minha visão não é muito boa. Com muita dificuldade, consegui chegar a um policial e perguntei o que havia acontecido e que precisava ir no 3º andar.

-Uma moça morreu. Ninguém tem autorização para adentrar o local do crime. Se você é morador, pode falar com o Magalhães,- apontando para um outro policial - ele te dará instruções de como prosseguir.

Achei aquilo um absurdo. Realmente bem próximo dali, no chão, parecia uma pessoa coberta. Mas pouco me importava a pessoa. Mariana estava presa dentro de seu próprio condomínio. Liguei para ela. Parecia que já estava ouvindo o adorável toque irritante dela "Nossa, nossa! Assim você me mata!". Não era minha cabeça, eu realmente estava ouvindo. Fiquei feliz por ela estar aqui fora e perto de mim. Não sei qual foi minha reação quando eu percebi o ocorrido. Mariana e seu inseparável telefone é que estavam sob aquele lençol horrendo. No mesmo momento, policiais saem pelo portão com um homem algemado.

-Eu não fiz nada! Ela que se atirou! - dizia ele, visivelmente perturbado.

Na mesma hora reconheci o rosto do infame. Era o ex-namorado de Mariana.

Peguei um ônibus e fui para qualquer lugar longe da cena que meus olhos não acreditam ver. Na primeira esquina havia um bar. Depois de quase um ano longe do vício, comprei um Marlboro. Cherei o maço, abri e fumei.


2 comentários:

Comenta aí!!