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quinta-feira, 9 de junho de 2016

Resquícios de um ouro qualquer


Pra mim, eram 13 graus. Mas não precisa me levar muito em consideração, pois imparcialidade não é meu forte. A tal Árvore dos Problemas nunca funcionou comigo e duvido que funcione para algum jornalista da face deste planeta. Carrego minhas crenças, meus achismos, meus problemas e meus amores sempre debaixo do braço. O esquerdo!

No caminho perdido para por em prática as atividades planejadas por anos, sozinhos, alheios ao conhecimento das vontades um do outro, pegaram um comboio de rumo dúbio. Ela via futuros amigos em rostos desconhecidos, sempre fizera isso, e às vezes utilizavam-se de sua boa fé.

Entraram, desconfiados, naquele prédio que não foi projetado pelo Niemeyer. O segurança abriu a porta com sorriso e frio, pelo choque da temperatura interna com a externa. Antes que alguma dúvida causasse destruição, uma senhora informada dá boa tarde, com panfletos e sugestões. Certamente a sugestão mais apreciada foi a de colocar a imensa e pesada mochila na chapelaria, gratuita e segura. Eram o número 16. Por 3 não foram o 13, mas o 13 não anda ganhando muitas coisas ultimamente. Linhas retas e janelas tortas. Janelas que pareciam retratos de uma Porto Alegre calma de um outono frio. As nuvens existiam ao céu como para enfeitar de branco e cinza o azul resplandecente. Contrastes. Passeios da escola trazem boas lembranças para ela, por isso ela sempre observa quando vê um bando de crianças guiados por um adulto. Problematizar as falas dos velhos parece uma necessidade, e problematizar as falas das crianças é apenas um laboratório experimental sobre a perspectiva de Piaget, ou pura diversão. Dentro, a exposições de dois artistas. O do terceiro e quarto andar certamente era parente ou fã do Cavalieri, pois utilizava seus princípios todo o tempo, seus volumes deformados, parados e ao mesmo, dinâmicos. O segundo andar era um ensaio de fantasmas e obras sem nome, além de desenhos de 93 que retratavam sentimentos sobre a política da época. Para ela foi um achado estar ali com ele, pois não entenderia nada sozinha. Em 93 ela apenas balbuciava suas primeiras palavras. Papá foi a primeira. Sentia fome.

E mesmo com um lugar do tamanho de algum mundo, conseguiam pechar. Pechavam corpos, olhares e imaginações. Ali, pariram, numa gravidez compartilhada, dois esquilos e uma marmota - mas essa história é tão longa e imprevisível que eles vão ter que dar um jeito de continuá-la em capítulos cooperativos.

Maçanetas. Camisetas. Planetas.

Decidiram por dar um jeito de atravessar aquela rua que mais é um contorno ao Guaíba. O método tradicional de atravessar ruas certamente não foi o pensado por quem construiu aquela rua. Trânsito contínuo. Sem faixas de pedestre. Cogitaram a existência de um estacionamento subterrâneo, visto entradas aparentes de estacionamento subterrâneo. Verdade. Um estacionamento bonito, amplo, branco, parecido com algum estacionamento de algum filme estadunidense de terror com palhaços.

- Eu poderia morar aqui. - afirmou ela.

- Olha o palhaço vindo ali atrás!

Ela olha e sorri.

- Não tem nada! Ainda poderia morar aqui.

Do outro lado da rua, um banco. A vista única do Guaíba. Pedaços de ouro brilhante sobre a água.

- Pode ser prata!? - ele argumenta.

Entre o vento frio e a atmosfera criada pelos dois, para os dois, ganharam ares para apreciar pequenos esporos de vida. Ela oferece uma bergamota. Os olhos dele, que refletem ouro e alguma gratidão, titubeiam. Mais que logo, ela saca a dita bergamota da montanha marrom que carrega nas costas. Ele pensa sobre como ela ainda consegue surpreendê-lo com coisas comuns. Ela pensa como foi ótima a idéia de colocar a bergamota na mochila, para comê-la ali, no sol, com ele. Ele oferece o último gomo a ela.

- Não precisa! Temos outra! - ela saca outra bergamota da mochila.

Parecendo fazer parte de uma peça teatral de comédia ingênua, riem. No meio de tempos corridos de uma cidade de concreto, eles se propõe a desvendar os verdes e as memórias a serem vividas. O beijo doce e cítrico se faz entre os lábios que se conhecem há tempos mas agem como novatos toda vez. Inúteis sob alguma perspectiva imediatista de consumo. Por outro lado, úteis como um toque sereno de calor e aconchego em busca de algum resquício de humanidade inventiva.

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