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terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Poema em Linha Reta

Pela terceira vez este poema surge em minha vida e rouba a cena.
Meu primeiro contato, foi na sexta série e dele pouco entendi, isto para não falar que nada entendi. Foi uma prova de português, interpretação de texto e gramática, me saí mal no teste (salvei-me pelo uso correto dos "porquês"). O que me chamou atenção na época, foi pelas palavras fortes (principalmente por "porrada" aushaush).

No segundo ano do médio, ele retorna. Eu, um pouco mais velha, me deixo seduzir pelo contexto de uma linha, que puxa ao homossexualismo ("...Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes...").

Hoje, ele aparece pra mim em um e-mail. Um amigo querido me envia um e-mail com o título "A massacrante felicidade dos outros - Martha Medeiros". É um arquivo pps onde ela cita algumas linhas deste poema do Álvaro de Campos. No meu monótono romantismo depressivo (me senti mt emo agora rsrsrsrsr) consegui ver o significado pleno do poema. Como disse a Martha, a grama do vizinho não é mais verde!

Acabamos nos inferiorizando tanto aos outros. Sentimos tanta pena de nós que enxergamos apenas a grama verde do lado e esquecemos que também temos um lindo jardim, tão quão ou mais lindo que do vizinho.

Já senti muito o que o Álvaro de Campos sentiu. Ver que todos vencem, que todos são lindos, perfeitos, "príncipes". Ver os outros curtindo a vida, bebendo, namorando, fazendo festa todas as semanas desde sexta até domingo. O que ele esqueceu ou não viu, foram as ressacas, os tombos. Na verdade ele viu, mas omitiu isso propositalmente, fazendo um exagero, uma caricatura da realidade, potencializando o sentimento de impotência

e pra vcs então, um pouco de...



POEMA EM LINHA RETA
Álvaro de Campos

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo.
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo. 


Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...


Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó principes, meus irmãos, 


Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo? 


Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra? 

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

Um comentário:

  1. Olá! mto lindo teu preâmbulo ao poema, fico feliz em saber que estas linhas representam algo importante para ti, pois para mim ele fala muito também!
    bjo grande! sucesso!

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